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ENTREVISTA
O
apartheid cultural brasieliro
Por
Ana Cristina Spannenberg (UPF
Jornal)
Mineiro,
autor de mais de uma dezena de peças teatrais,
filmes e novelas, Alcione Araújo critica a separação
cultural que vem sendo estabelecida no Brasil há
várias décadas. Este verdadeiro apartheid
cultural exclui mais de 70 milhões de brasileiros.
Alcione
Araújo participa da Jornada Nacional de Literatura
no dia 28, às 16 horas como debatedor do painel
"Espaço polêmico: Como tornar o Brasil
uma nação letrada". O
autor participa também da mesa-redonda "Televisão:
elo na evolução do livro ao e-book",
no dia 30 de agosto, às 19h 30min.
Nos
anos 80, Alcione Araújo deixou a carreira de
professor universitário, com pós-graduação
em Filosofia, para se tornar escritor profissional.
É autor de 11 peças teatrais, 12 filmes,
minisséries e novelas para a TV. Além
delas, estreou como romancista com o livro Nem
mesmo todo o oceano, lançado em 1998. Dirigiu
a Coleção Dramaturgia de Sempre, da Editora
Civilização Brasileira, que reúne
algumas das mais significativas peças da dramaturgia
brasileira e universal em livros voltados para estudantes
de ensino básico e médio. Atualmente,
é presidente do Comitê
Rio, integrante da Ação pela Cidadania
contra a Fome, Miséria e pela Vida, criado em
1993 pelo sociólogo Herbert de Souza, Betinho.
Como
pode ser definido o "apartheid cultural"?
O que eu chamo de apartheid cultural é como se
existisse um cordão sanitário separando
uma parcela da população que participa
da vida cultural do país e outra parcela que
fica completamente afastada e alheia a essa vida cultural.
Vou exemplificar com números.
Dados do IBGE, mostram que a população
brasileira é de 170 milhões de pessoas.
Estima-se que aproximadamente noventa milhões
dessas assistem à televisão, que é
uma forma de inserção da indústria
cultural na produção de entretenimento.
E, pelo número de CDs vendidos, de espectadores
que vão ao cinema, de pessoas que vão
ao teatro, que compram livro e tal..., estima-se que
um a dois milhões de brasileiros participam da
vida cultural do país. Todo o resto está
completamente à margem. É desse resto
que eu estou falando: de setenta ou oitenta milhões
de pessoas, um país do tamanho do México,
de duas Argentinas, cinco vezes Portugal. É um
volume de pessoas gigantesco, o que coloca uma distância
tão grande de vivências culturais que corremos
o risco de, daqui a pouco, se isso já não
estiver acontecendo, termos duas civilizações
numa mesma geografia. A tal ponto que você vai
chegar em determinados lugares, vai falar e ninguém
vai entender.
A
indústria cultural pode ser uma das formas de
inserção?
Se excluirmos a indústria do entretenimento,
isso se agiganta ainda mais. Quer dizer, se considerarmos,
como é de fato, que a televisão não
é arte, então, a vida artística
do país tem cerca de dois milhões de pessoas,
se tanto. Estou somando uns com os outros e até
duplicando, porque às vezes as pessoas que compram
CDs são as mesmas que compram livros, que vão
ao teatro... então essa quantidade também
é artificial. Trata-se de uma distância
descomunal entre as experiências vivenciais e
intelectuais de uns e outros, o que torna as percepções
do país completamente diferentes. Esse é
o quadro onde se passa o apartheid cultural. Quando
eu digo que ele é mais grave que o apartheid
econômico e social é porque o outro, através
de uma medida governamental ou política de distribuição
de renda, você pode rapidamente recuperar. Isso
se resolve com dinheiro. A questão da cultura
não se resolve com dinheiro. São anos
de vivências e práticas culturais.
Leia
a entrevista na íntegra
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